Ultimamente a esquerda tem-nos presenteado com um bailado folclórico de extremo interesse e de grande preocupação. A dança de acasalamento à volta de Manuel Alegre de José Sócrates, de um lado, e de Francisco Louçã, de outro lado, tornou-se uma acelerada Polka entre os três políticos.
Já era sabido que Manuel Alegre tinha ditado uma forte e simbólica ruptura da máquina do Partido Socialista, que, de acordo com a sua opinião, de socialista teria pouco e de máquina teria muito. Desde as anteriores presidenciais que Manuel Alegre se viria a distanciar, formando até o Movimento pela Cidadania, que alguns chegaram a preconizar como a chegada de um novo partido. E paralelo a este distanciamento das políticas de direita era visível um subtil flirt a Manuel Alegre daquela que se colocava como a nova esquerda, dos ideias sociais e solidários, a esquerda do Bloco que, para Manuel Alegre, de esquerda tinha muito e de bloco teria pouco.
Como já foi discutido recentemente neste blog, esse flirt tornou-se num singelo namoro quando Francisco Louçã, antecipando-se a qualquer conversa de candidaturas antecipadas, dá publicamente o mote para Manuel Alegre avançar para as presidenciais e, com o apoio formal do Bloco. Cavaco Silva, que tinha sido eleito por uma direita unida contra uma esquerda fragmentada de candidaturas soltas, viu Belém a lhe escapar pelos dedos mas sabia que nada podia fazer, apenas podia esperar por um milagre que lhe salvasse o assento.
Ora então, não é que é mesmo durante o debate das legislativas que, devido à forte concorrência de parte do PSD, os media começam a especular uma possível e mui hipotética coligação entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista. A pergunta teve um efeito tal e qual a Coca-Cola em Portugal, primeiro estranhou-se tal consideração, mas à medida que se considerava uma hipótese do Partido Socialista de voltar à sua querida maioria absoluta, esta questão começou a entranhar-se dentro das lides socialistas (e sejamos honestos, pelo menos a ser equacionada pelos militantes bloquistas).
Ora esta não era a primeira vez que se falava do grande passo que seria o Bloco de Esquerda entrar numa governação, nem seria a primeira vez que se falava disto acontecer via coligação com o PS. Mas enquanto anteriormente estas hipóteses eram tão longínquas quanto uma coligação entre PCP e PS, esta campanha tinha tido o flirt bloquista aos votos socialistas e a Manuel Alegre, bem como as propostas de casamento socialistas a militantes bloquistas (como aquelas aceites de Miguel Vale de Almeida e Inês de Medeiros ou a negada de Joana Amaral Dias) o que veio a aproximar frequentemente as duas organizações, já para não falar da sugestão de Ana Gomes e do OK de Mário Soares.
E quando, então, vemos Manuel Alegre na sua amada Coimbra, a apoiar publicamente José Sócrates na sua caminhada legislativa, vemos a tal dança de acasalamento, passar de uma ferramenta de sensualidade de duas vias, para ser uma agressiva e bem oleada Polka entre os três, um à procura do assento Presidencial, outro à procura de um assento maioritário no Parlamento, e o outro à procura duma estreia governativa.
Estrategicamente esta coligação não podia ter vindo em melhor altura, nem de facto em melhores moldes e, aliás, daqui a quatro anos até faria sentido de algum modo. Mas se esta semana o Bloco vier publicamente apoiar a ideia, tudo o que o Bloco tem defendido será destronado pela velhinha sede de poder. São programas com grandes discrepâncias, e uma maioria de pulso de ferro do PS que iriam tornar qualquer hipótese governativa do Bloco num desastre ambulante (mesmo apesar de boas intenções) bem como o Bloco perderia a irreverência de um partido de contestação sustentada, para a de um típico partido de coligações temporárias do swing eleitoral.
Resta agora, saber se o eleitorado conseguiu, como a própria base bloquista, perceber que tudo não se passou de uma tampa do Bloco ao PS, para lhe deixar com a àgua da maioria absoluta na boca, mesmo já tendo esta vindo à superfície.
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